Nem se piscou os olhos
e agosto se foi
e assim
tão de repente
o ano acabou

Entram os meses que me esqueço
meses que nunca me lembro
sete, oito, nove...doze!
Dezembro!

Amanhã, dia 19
quando agosto se findar
quem sabe ainda haja vida para viver
quem sabe ainda haja vida

Os ventos que agora cortam as peles
e que esfriam amores
sopraram muito antes
antes que agosto destilasse seus sabores

agora não sobram nem brumas
nem névoas
nem ar para respirar

apenas esses ventos
esses ventos que cortam
e cortam apenas

Viver nesse não tempo
pós agosto
é olhar para o espelho
e não ver o rosto

é não beber o vinho
se contentar com o mosto

é saber-se vivo
mesmo morto












O asfalto se abria
como o mar vermelho
e abaixo da sola
a cada passo
surgia um passáro

os carros paravam
em fila vertical
para que tu passasses
a braçadas
por esse umbral

a música que cortava
feito uma adága
separava os cogumelos do meu peito
e os passáros desciam
para respirar
nosso ar mais rarefeito

Vi a lua sorrir
e não era para mim
e não era pra você
e não era pra ninguém

Um homem ao meu lado
acabou de sair voando
era o mais infeliz dos homens
comprei um cigarro
pra servir de vela no meu aniversário
em dezembro
em dezembro
em dezembro

o céu resolveu beijar o mar
se derretia
ficaram verde
a floresta se avermelhou de vergonha
debaixo do meu pé
nasceram pelos

a pedra que me aconselhava
dessa vez não tinha conselhos
saiu do meio do caminho
entrou em desespero
e me deixou no vazio
que é olhar pro espelho