Antes que eu pudesse
ao menos sonhar
em estar com você
em correr pelos prados
e me deitar ao sol da manhã

Antes que eu soubesse
que havia por ai
tantas e tantas pessoas felizes
que já sonhavam
desde sempre sonhavam
em ser importantes

Eu
eu já me preocupava
e conhecia os sinais do céu
e o sabor das lágrimas
o cheiro da poeira
e a textura do chão

Meus calos nasceram comigo
são heranças de meus pais

A esperança conheci como ilusão
e mesmo assim ela me manteve
vivo
entre preces incessantes
que ainda hoje permanecem em meus lábios
fazem parte de mim
a fé
maria santíssima
rogai por vós que me leem
e me leem em oásis

Em São Paulo chove
uma chuva que nada resolve
São Pedro por que?
Por que chove em São Paulo?

seus cachorros tem mais que a gente
toda gente que morre
sedenta
a carne dos bichos
os mesmo que vos alimentam
ressecam em couro e osso
por entre nossos quintais

Quando fui para perto de vós
toda sua bonança me surgia como afronta
dai pra frente
nunca mais fui feliz

desumanizado
desfigurado
doente
um número

perto dos outros números
ainda era alguém
um alguém-número
sem valor
a esquerda
somados todos nós
não éramos
não somos
ou quase
quase...
muitos zeros valem mais quem um

você
volta comigo pra mim
me guia de volta ao eu
eu sinto que ainda moro aqui
me desperta do sono da ira
ira que me paralisou
me chama pelo nome
e beija minha alma seca
molha com húmus
mesmo que eu não possa mais ser feliz
me dê alegria
por uma noite
e se vá
não te demores aqui
pra que eu não te odeie também
ó meu amor
ó meu amor
ó amor

quero voltar a ser número
a ser nada
e ser consumido
consumido
sumindo
sumindo
e sumir
para sempre
e sempre
amém