Hoje é dia 18
e sinto um desgosto
com a vida

Procuro fugas
mas minhas rugas
me dizem não haver mais saída

A gente nasce
com a difícil tarefa de entender o mundo
e acaba por se viciar em cigarro

Tenho pena de quem não fuma
e mais pena de quem ainda fuma

Eu nunca tive dinheiro para comprar um carro
e amo carros
talvez se eu tivesse, amasse cavalos

Hoje é dia 18
e um desgosto
devasta a alma

Detesto fugas
e minhas rugas
me lembram meus traumas

A gente nasce com a difícil tarefa de encontrar um amor
e quando é encontrado por ele
acaba se viciando em si

Tenho pena de quem não se ama
e mais pena ainda de mim

Eu nunca tive um desespero que me levasse a morte
Talvez se tivesse, amasse mais a vida

Hoje é dia 18
amanhã 19
e ch-oro
pra que de alguma forma
algo que ainda não envelheceu
se renove







Estou fazendo
o que deveria ter feito
há dez anos atrás
mas há dez anos
eu não sabia o que fazer

Estou amando
como sempre
sempre deveria ter amado
mesmo que eu não soubesse
como amar
no passado

E hoje não posso ser
o que sonhei para mim
e se hoje eu pudesse
não seria assim

Estou contente
que meus planos
deram errado
mesmo que eu nunca
os tenha planejado

Estou contente
mesmo que tenha decepcionado
meu eu do passado
Estou saudoso
mas alegre, contente
fazendo o que devia
há dez anos
no presente


Não existe fim premeditado
Quando se sabe do fim
é porque o fim
em alguma hora
chegou de surpresa

O fim é sempre como algo derramado
um copo quebrado
no susto de um gesto desatento

As lágrimas vem
para quem já havia acabado
Porque a surpresa paralisa
e no espanto não há choro

O choro vem após o fim ser decretado
mas vivido antes
bem antes

Lágrimas são como chuva
que regam o deserto do fim

O realista sofre menos
Sofre à prestação
Foi pego pelo fim em algum momento
mas parcelou a dor
viveu o luto
mesmo quando ainda junto
Viu o paciente partir já em estado terminal
Teve tempo de se despedir

O esperançoso sempre é pego no repente
Como uma bala perdida
um atropelamento
Um enfarto fulminante em um jovem
Cai no espanto
Entra no limbo da perplexidade
Atónito
Sem movimentos
Paralisado

As lágrimas do realista são como doce chuva
São da despedida do velho avô
que se foi de velhice

Os olhos secos e petrificados do esperançoso
onde rola uma única lágrima
que é como uma mensagem
um broto novo em árvore caída
só pra lembrar que ali existe vida

Certo é
que decorrido o tempo necessário
o choro estoure como uma barragem amontante
contida, transbordante de dejetos
mas ninguém vê
e quem morre
ela
o derradeiro
sobrevivente
Esperança









O que havia antes de nós?
Onde ficaram as memórias?
O que éramos antes de nós?
Quem éramos?
O que era?

Em algum lugar
Em algum momento
Onde se perdeu?

Quem antes reparou no tempo?
Quem foi o primeiro a dizer: antes?

Quem foi o primeiro a dizer?

E antes, o que havia?

Há um vazio
Dentro
Fora
Um vazio
Uma falta de ideias
Um branco eterno em nossa mente
O que havia antes?
Antes de nós?

Você era perfeita
Sublime
Exuberante
Ainda és

E por querer se repartir
nos gerastes
mesmo sendo perfeita
sublime
exuberante

Ainda és.

A violência e o caos
caminham em total delicadeza
Nos ensina em sua paciência
Se é que ainda aprendemos

És perfeita!
Sublime!
Exuberante!

Há um vazio em meu peito
Por não me sentir completo
Amargo em desrespeito
Me sinto um objeto
Mais como um dejeto
Por estar fora de contexto

Você que não se revolta
o mundo a minha volta
quer me dizer o contrário

Se explode em tamanha fúria
Não é a fúria que te explode
É que tenta arrumar jeito
Por ter, assim, tanto zelo
Pelo que és
e pelo que foi outrora

Há um vazio em meio peito
Por não me sentir completo
Amargo em desrespeito
Me sinto como que sem teto
Entre abismos sobre um graveto
Consome-me o desespero

O que havia antes de nós
senão o que é perfeito?

Perdoe-nos
por ser o que somos
ou o que nos tornamos
Se hoje a chuva já não nos alegra
A culpa é nossa
é do que as sua águas carregam

O que haverá depois de nós?
Onde ficará a memória?
Será o fim
Ou início
Da derradeira história