Meu filho
Que prestes está pra nascer
Herdará, de mim
pelo menos no que de mim depender
um mundo melhor


Mas o triste de tudo
é que por mais que me esforce
não creio no que digo


Por essas bandas de cá
onde o sol sempre reinava
já reina há muito tempo
um tempo tempestuoso
de desastres de todo tipo


Eu queria que herdasse de todos nós
qualquer coisa diversa do que vivemos
que fosse guerra
pra que em pensar em guerra
pensássemos num provável fim da guerra


Mas onde nos metemos!
Numa guerra que não tem fim
porque não temos coragem
e coragem sempre nos falta
de nos declarar em guerra
pra que talvez, assim, lutássemos


Na Barra
que não era uma "barra"
mataram com uma barra (essa de madeira mesmo)
um refugiado
e pra espanto de ninguém
foi o terceiro em menos de um mês


Tentaram sabotar o que nos resta
e o que nos resta além de esperança?
Disseram que esperança é coisa dos fracos
que esperar é coisa ruim
quase me convenço de que têm razão
mas ainda tenho esperança


Meu filho há de nascer
E seu nome como profético
Como um raio
Caio!
Caio em mim
E oro
Pra que caiam
Caiam todos em si
Que somos uma coisa só
E que essa barbárie existe antes
antes da morte factual
existe em mim
como potência
mas antes
como advertência
do que devo me livrar
dessa violência
que habitava, outrora
apenas o recôndido do nosso ser
e que pulou pra fora


Queria lutar
Lutar por mais equidade
quem sabe por mais iguadade
mas Caio
nossa luta, por ora
é contra a bárbarie
antes, a que nos habita
que ela morra em você
e talvez nem nasça
seja da luz esse raio
gentil
Caio.